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Imagem referente a Exposição no IMS de São Paulo mostra ditaduras chilena e brasileira
© Gilberto Marques/A2img/Governo de São Paulo

Exposição no IMS de São Paulo mostra ditaduras chilena e brasileira

Em 1973, o fotojornalista Evandro Teixeira (1935) foi enviado pelo Jornal do Brasil (JB) para cobrir o golpe militar no Chile. Acompanhado do repórter Paulo César de......

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Por CGN

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Imagem referente a Exposição no IMS de São Paulo mostra ditaduras chilena e brasileira
© Gilberto Marques/A2img/Governo de São Paulo

Em 1973, o fotojornalista Evandro Teixeira (1935) foi enviado pelo Jornal do Brasil (JB) para cobrir o golpe militar no Chile. Acompanhado do repórter Paulo César de Araújo, Teixeira embarcou para o Chile no dia 12 de setembro, um dia após o golpe que culminou com a morte do então presidente Salvador Allende. Com as fronteiras fechadas pela junta militar chilena, ele só conseguiu entrar em Santiago no dia 21 de setembro, quando foi permitido que a imprensa registrasse o acontecimento, mas sob forte vigilância militar.

Com a máquina analógica guardada dentro da jaqueta e sempre preparada para o clique, Teixeira conseguiu se desvencilhar da censura chilena e fazer os mais importantes registros daquele período para a imprensa brasileira. E são essas fotos, produzidas em preto e branco para o JB, que estão em exposição a partir desta terça-feira (21) no Instituto Moreira Salles, em São Paulo. A mostra Evandro Teixeira, Chile, 1973 é gratuita e fica em cartaz até 30 de julho. A curadoria é de Sergio Burgi, coordenador de fotografia do IMS.

“A exposição olha primordialmente para o material que o Evandro produziu em Santiago dias após o golpe militar de 1973. E essa apresentação é construída em diálogo com o que ele havia produzido antes no Brasil, também no período de ditadura militar – imagens icônicas como a da tomada do Forte de Copacabana no dia 1º de abril de 1964, no primeiro dia do golpe”, disse Burgi, em entrevista à Agência Brasil.

Aliás, essa foto produzida por Teixeira sobre a tomada do Forte de Copacabana, em que os militares são apresentados sob forte sombra e chuva torrencial no Rio de Janeiro, apenas com uma luz brilhando ao fundo, é um de seus registros preferidos. Apó visitar a exposição em sua homenagem, em São Paulo, Teixeira contou como a imagem foi feita. “As 5h, o Leno [capitão Leno, que era seu vizinho no Rio de Janeiro] bateu na minha porta dizendo que o golpe militar estava acontecendo. ‘Você vem comigo ou não?’, ele falou. Naquele momento, coloquei a câmera dentro da jaqueta, enchi os bolsos de filmes e levei só uma lente de 35 milímetros. E parti para lá”, contou o fotojornalista. E foi assim que ele fez o primeiro flagrante do golpe de 1964.

Ao todo, a exposição apresenta 160 fotografias, além de livros, vídeos, fac-símiles, crachás de imprensa e até a máquina que Teixeira precisou levar ao Chile para transmitir ao Brasil suas fotos analógicas. Das 160 fotos em exposição, 130 apresentam as imagens feitas por ele naquele país. As demais são fotos em que retrata a ditadura brasileira. Entre elas está uma das mais famosas do período em que registrou centenas de pessoas aglomeradas na Cinelândia, no centro do Rio, segurando uma faixa onde se lê: Abaixo a Ditadura, Povo no Poder, feita durante a Passeata dos 100 mil. A foto, que havia sido escolhida para estampar a capa do Jornal do Brasil, acabou sendo censurada pelos militares e não pôde entrar na primeira página do jornal. Mas se tornou uma das imagens mais conhecidas sobre a ditadura militar brasileira.

“Ele fez uma série de imagens das manifestações de 1968, que começaram com o assassinato do estudante Edson Luis (Edson Luís de Lima Souto, morto por militares brasileiros], passou pela missa de sétimo dia reprimida na Candelária, que culminou depois na chamada ‘sexta-feira sangrenta’ [evento em que os militares reprimiram uma passeata de estudantes, provocando a morte de pelo menos 28 pessoas]. E, por fim, retratou também a Passeata dos 100 mil”, explicou Burgi.

Salas expositivas

A exposição apresenta três grandes conjuntos de imagens feitas por Teixeira nessa viagem ao Chile. No primeiro espaço são apresentadas fotos que ele fez da ditadura brasileira e também imagens em que retratou o que aconteceu no Estádio Nacional de Chile, “transformado em um campo de detenção, torturas e assassinatos”, segundo o curador.

“A junta militar [chilena], ao liberar a imprensa internacional, tentou fazer a reconstrução de uma narrativa às avessas do que de fato estava acontecendo no Estádio Nacional. Ele [Teixeira] e dezenas de fotojornalistas foram levados ao estádio, que foi previamente preparado com apenas 10% dos presos escolhidos para ficarem ali nas arquibancadas. Enquanto o coronel dava entrevista dizendo que os presos tinham direito a banho de sol e atendimento médico, o Evandro, que já conhecia o local por ter coberto a Copa do Mundo, desceu ao subsolo e mostrou imagens de estudantes chegando, presos”, disse o curador.

Evandro Teixeira se lembra bem desse momento. Ao visitar a exposição nessa segunda-feira (21), ele contou à Agência Brasil como foi vivenciar essa parte da história. “Foi um momento de tensão no Estádio Nacional, por exemplo. Como eu conhecia o estádio, por já ter estado na Copa do Mundo de 1962, eu sabia onde estava pesando. Sabia que lá tinha um porão. E aí quando eu estava acompanhando a visita [oficial] ao estádio, quando acabou [essa apresentação], dei uma fugida e fiz rapidamente meia dúzia de fotogramas de estudantes presos encostados no paredão. E todos eles morreram. Todos que estavam no fotograma morreram”, contou. 

O segundo espaço da sala expositiva apresenta fotos feitas por ele nas ruas de Santiago. É nesse espaço que se encontra também a máquina de telefoto, que funcionava como aparelho de fax e que utilizava para enviar fotos do Chile para o Jornal do Brasil. “Aqui há uma série de imagens do Palácio de La Moneda bombardeado, da cidade ocupada pelo Exército e do cemitério periférico com covas abertas”, descreveu o curador.

Já o terceiro espaço apresenta as imagens que Teixeira fez sobre a morte e o enterro do poeta chileno Pablo Neruda. O fotógrafo havia conhecido Neruda e sua esposa Matilde ainda no Brasil, quando estiveram em Salvador para visitar o escritor Jorge Amado.

Assim que chegou ao Chile para retratar a ditadura, Teixeira soube que Neruda estava hospitalizado em uma clínica. E se dirigiu ao local. Lá encontrou Neruda já morto e acabou fazendo os únicos e últimos registros do poeta. “Ele foi com uma câmera escondida, conseguiu passar por uma entrada lateral e chegou a uma área onde o corpo do Neruda havia sido trazido para a preparação [do enterro]. Há uma foto importante que ele faz, a primeira delas, em que está a viúva do Neruda [ao lado do corpo]. Ele fez a foto e se apresentou para ela, lembrando da visita deles a Jorge Amado. E aí ela pediu que ele lá ficasse e a acompanhasse. O fotojornalista fez 36 horas de documentação entre a clínica, a casa deles, o velório e o enterro. Essa acabou virando a primeira manifestação política contra o regime de [Augusto] Pinochet”, disse o curador.

As fotos sobre a morte e o enterro de Neruda são apresentadas acompanhadas por trechos de suas poesias. “Tem uma foto de dona Matilde em um cubículo, ao lado da porta por onde entrei. Quando abriu a porta da Clínica Santa Maria, eu estava rodando por ali e procurando por onde entrar. Vi uma portinha aberta e entrei. Quando entrei naquele cubículo, vi o corpo do Neruda em uma maca e dona Matilde sentada ao lado. E aí eu ‘pá’, cliquei. Primeiro eu fotografei e depois fui falar que eu era o fotógrafo [que fez imagens] do Jorge Amado. ‘Lembra?’, disse a ela. Aí ela olhou para mim e afirmou: ‘meu filho, sua presença aqui é muito importante’”, lembrou Teixeira.

Então, ele foi autorizado pela viúva a fotografar o velório e o enterro do poeta, que foi acompanhado por uma multidão. “Foi bem emocionante. Eu chorei lá. Eu subi no túmulo para fotografar de cima e vi o povo cantando: ‘Neruda está vivo’. E aí eu chorei. Com as lágrimas derramadas, eu me segurei. Foi um momento lindo”, contou.

As ditaduras

Na entrevista à Agência Brasil, o fotojornalista que vivenciou os períodos violentos de ditadura militar no Brasil e no Chile disse que não há diferenças entre eles. E ressaltou que, saber sobre esse período na história dos dois países é importante para que a sociedade jamais permita a volta das ditaduras. “Aquilo que aconteceu em Brasília [a invasão dos três Poderes, no início de janeiro deste ano] foi uma vergonha. Aquilo me deu um negócio. Aquilo foi uma coisa triste”, lamentou.

“Esse tipo de exposição é importante para ensinar à novas gerações o que é a ditadura. Diferentemente do Brasil, a Argentina e o Chile tiveram um processo de julgamento [dos responsáveis pelas torturas e mortes do período] que permitiram às novas gerações conhecer a história. Como no Brasil não houve esses julgamentos, esse tipo de iniciativa, a exposição é fundamental”, afirmou Carina, filha do fotógrafo.

O bate-papo também deve incluir a importância do papel do fotojornalista nos registros históricos. “Minha aventura pessoal identifica-se com a aventura vivida pelo mundo. Não tenho méritos para isso, sou um homem manejando uma câmera. Quando bem operada, é um fósforo aceso na escuridão. Ilumina fatos nem sempre muito compreensíveis. Oferece lampejos, revela dores do impasse do mundo. E desperta nos homens o desejo de destruir esse impasse”, disse o fotógrafo em texto sobre a exposição.

A mostra no Instituto Moreira Salles tem entrada gratuita. Mais informações podem ser obtidas no site da exposição. “Tomara que muita gente venha ver porque, modéstia a parte, eu não tinha ainda a dimensão da qualidade e da quantidade do que eu tinha feito”, disse o fotógrafo à reportagem.

Fonte: Agência Brasil

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