Coletivos lésbicos fortalecem redes de mulheres nas periferias
Espaços de trocas, de formação, de resistência, de acolhimento e, também, de alegria e diversão. Nas periferias brasileiras, mulheres lésbicas criam coletivos e organizações e se......
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Por CGN
Espaços de trocas, de formação, de resistência, de acolhimento e, também, de alegria e diversão. Nas periferias brasileiras, mulheres lésbicas criam coletivos e organizações e se fortalecem, juntas, na busca pela garantia de direitos. Para marcar o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, a Agência Brasil conversou com algumas dessas mulheres, que mostram a necessidade de se dar voz e garantir políticas públicas voltadas para a saúde, moradia, segurança pública, entre outras, especificamente para esse grupo.
“A ideia era de sociabilidade, isoporzinho, roda de conversa, para falar de vivência, de como estava sendo para a gente ser sapatão na favela”, conta a assistente social, coordenadora da Casa Resistência e fundadora da Coletiva Lésbicas da Maré, Dayana Gusmão.
“A mulher negra hoje é jogada para um espaço de solidão absurdo e quando tem cruzamento de lésbicas e negras da favela, esse espaço de solidão é quase duplo. Quando meninas mais novas que olham para coletiva e veem que não estão sozinhas, quando vejo casa cheia de lésbicas novinhas convivendo com mais velhas, essa é a importância da coletiva, é servir como farol para lésbicas na favela perceberem que não estão sozinhas”, diz Dayana.
Foi essa rede que trouxe a vice-coordenadora da casa de acolhimento, Camila Felippe, para a Coletiva Lésbicas da Maré. Ela relata que entrou no grupo em 2019. “Foi quando começo a virar a chave de entender que minha militância, enquanto mulher favelada e mulher negra, não pode estar dissociada de mulher sapatão”, diz. Segundo ela, o grupo tem demandas específicas, diferentes das demandas da população heterossexual e também das lésbicas não periféricas.
“A partir do momento em que somos vistas e notadas, vão começar a questionar sobre o que precisamos ou não precisamos, enquanto não conseguirmos isso, não conseguirmos nossa visibilidade, nossas questões não serão ouvidas, não serão de interesse.”
O espaço recebeu, neste ano, a medalha Chico Mendes, premiação voltada para homenagear pessoas ou grupos que lutam pelos diretos humanos. A psicóloga e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF) Beatriz Adura, que coordena o acolhimento explica que a casa adota um modelo chamado antimanicomial. Quem chega ali, recebe a chave de casa e pode ir e vir quando quiser. “É um projeto de morada, é uma casa, para que meninas expulsas de casa possam ter um lugar confortável, um lugar acolhedor”, diz.
Com oficinas, músicas e espetáculos, a Tambores foi ganhando espaço e dando voz a mulheres lésbicas e bissexuais periféricas. “Somos periféricas, então, nossa construção é a partir das periferias”, diz Rodrigues. “É uma dimensão forte, porque a realidade de uma lésbica periférica é muito diferente da lésbica de classe média, são muitas questões e muitas camadas de opressão que se cruzam, desde o acesso a saúde, do acesso à educação, acesso à transporte, à violência policial. Então, a gente tematiza e evidencia muito sermos lésbicas periféricas”.
A Tambores criou dois espetáculos – Tambores que ecoam contra todas as opressões (2011) e A Voz do tambor periférico (2019) [LINK: https://www.youtube.com/watch?v=yGps-rhby0U], além do bloco de carnaval Cola Velcro. Também são várias as músicas e clipes gravados. Hoje, a Tambores de Safo, integra o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos do Ceará.
Segundo a integrante do grupo, isso faz com que as pessoas se engajem e recebam bem a Tambores. “A gente construiu o bloco Cola o Velcro, quando bota o bloco na rua, com músicas que problematizam a lesbofobia, tem pessoas que inclusive são heterossexuais e que engajam porque a alegria, ela agrega”, diz Rodrigues.
Para Farias, o coletivo é a realização de um sonho e é, segundo ela, o primeiro e único coletivo de lésbicas negras de Belém.
O coletivo realiza formações não apenas em Belém, mas em outros municípios do Pará, atua em comunidades quilombolas e territórios de matriz africana, sempre com a perspectiva racial e de gênero. Em 2020, com a pandemia, a Sapato Preto começa também a realizar um trabalho de base para garantir auxílio alimentar e realizar outras ações para fortalecer essas mulheres.
Farias atua hoje junto ao governo do Pará, como coordenadora estadual dos Direitos das Pessoas LGBTQI. “Hoje sou a primeira mulher negra e sapatão, no cargo de coordenação LGBTQI do estado e, pela primeira vez conseguimos colocar dentro do estado uma ação da visibilidade lésbica, voltado para lésbicas, com palestras para lésbicas. Isso é reflexo de Sapato Preto na minha vida”, diz.
Segundo Farias, um coletivo lésbico voltado para mulheres negras e periféricas é importante para dar visibilidade para demandas específicas desse grupo, como acesso a moradia, acesso à saúde pública, questões também ambientais e de sustentabilidade.
“Como essas mulheres lésbicas estão experienciando isso dentro dos territórios e das periferias? Como estão acessando os programas de moradias, se somos as primeiras a sermos expulsas de dentro de casa, como acessam o cadastro de moradia, de habitação? Falar da urgência de mulheres que amam outras mulheres, que quebram essa lógica normativa e, ainda dentro desse grupo, mulheres negras lésbicas, que ainda passam pela questão do racismo ou mulheres trans lésbicas, experiências que são ainda mais diferenciadas, com lesbofobia, transfobia”.
“O mês de agosto é importante para termos mais visibilidade e poder auxiliar jovens lésbicas e sapatões, que ainda não têm o apoio da família e sofrem diversos tipos de violências, para que tenham mais informações sobre seus direitos e como se proteger”, diz Melissa.
Para ela, os avanços são ainda poucos e instáveis, pois não há uma legislação definitiva pra garantia dos direitos das mulheres lésbicas. “No DF, não temos nenhuma legislação que combata a lesbofobia, existem leia estaduais e municipais, mas não nacionais. Nacionalmente, utilizamos as jurisprudências para nós proteger”, ressalta. Nesta terça-feira, uma conquista é de que haverá a primeira sessão solene na Câmara Federal em virtude ao Dia Nacional da Visibilidade Lésbica.
Visibilidade Lésbica
Agosto é o Mês da Visibilidade Lésbica, com duas datas, o dia 19, que é o Dia do Orgulho Lésbico, e dia 29, que é o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. O dia 29 foi escolhido por ser a data do 1° Seminário Nacional de Lésbicas, em 1996, promovido para chamar a atenção para as pautas do grupo e para as violências sofridas.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pelo menos 0,9% das mulheres brasileiras declara-se lésbica e 0,8% bissexual. Entre 2021 e 2022, a Coturno de Vênus e a Liga Brasileira de Lésbicas (LBL) realizaram o Lesbocenso Nacional, para conhecer o perfil das mulheres lésbicas brasileiras. Os dados mostram que 37,1% residem em bairro de classe média; 13,83%, em periferias; 2,8%, na zona rural; 1,7% em favelas e, 0,8% em comunidades quilombolas e 0,04% em aldeias indígenas.
A maior parte dessas mulheres, 78,61%, sofreu lesbofobia, ou seja, discriminação por serem lésbicas.
Fonte: Agência Brasil
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