Drama realista está em alta na teledramaturgia

Segunda Chamada segue a trilha de Sob Pressão, mas no campo da educação. A série trata dos dramas vividos por professores e alunos, que decidiram voltar...

Publicado em

Por Agência Estado

O atual sucesso de dramas realistas tanto na TV quanto no streaming derruba por terra a tese de que o público tem buscado na ficção histórias que o afaste da realidade. E produções como a minissérie Chernobyl, da HBO, sobre a catástrofe nuclear, e as séries Sob Pressão e Segunda Chamada, da Globo, são bons exemplos disso. A repercussão em torno de Sob Pressão, aliás, parece ter consolidado esse gênero na emissora. Com as quarta e quinta temporadas já confirmadas, a série, que estreou em 2017, acompanha o difícil cotidiano de um hospital público na periferia do Rio.

Segunda Chamada segue a trilha de Sob Pressão, mas no campo da educação. A série trata dos dramas vividos por professores e alunos, que decidiram voltar a estudar depois de adultos, numa escola pública. A primeira temporada da produção, exibida este ano, conquistou público e crítica – e os prêmios APCA de melhor série e atriz para Debora Bloch. A segunda temporada, com 13 episódios, vai ao ar em 2020. “Já era prevista (a nova temporada), mas não assim tão rápido, teve uma certa antecipação. Seria para a gente estrear em outubro e, agora, será em abril”, conta a diretora artística da série, Joana Jabace.

Para ela, as pessoas ainda querem ver histórias que dialoguem com a realidade. “Não acho que o espectador só quer ver escapismo, acho que tudo depende da maneira como é colocado, como é contado”, acredita. Joana lembra que, antes da estreia, ficou pensando como os assuntos abordados na série seriam recebidos pelo público. “Segunda Chamada foi bem-sucedida porque a gente trata de temas reais, duros, mas com muito afeto. Acho que a série é muito afetuosa, investe na emoção. Por mais difícil que seja o tema, a gente está falando com o coração dos personagens. Não é uma série exatamente racional, e acho que a emoção comunica independentemente de tudo. No fundo, as pessoas querem ver a realidade.”

Há 15 anos na Globo, Joana Jabace assina sua primeira direção artística em Segunda Chamada. Com outros trabalhos bem-sucedidos na casa, como assistente de direção de Paraíso Tropical, diretora de Avenida Brasil e diretora-geral de Assédio, Joana fez faculdade de Jornalismo e tem como escola o cinema documental. “Trabalhei muito tempo com Eduardo Escorel, João Moreira Salles e Eduardo Coutinho. Foi quando entrei nesse universo”, diz. “Quando eu estava trabalhando com eles, começou a me dar vontade em ter alguma experiência em dramaturgia e, principalmente, trabalhar com ator.”

Para ela, Segunda Chamada é um projeto essencialmente de ator. “Não é um projeto formalista, ou uma coisa de época ou de ação. É mais invisível o trabalho de diretor nesse aspecto, e é o que mais gosto, porque é um trabalho de atuação. Quando li o projeto, falei: acho que o melhor caminho é a gente encontrar uma linguagem muito naturalista de interpretação, próxima do docudrama. Fiquei vendo muitos filmes de escola e, quando eu via documentários sobre esse assunto, era o que mais me pegava. Eu falava: é sobre isso que a gente está falando. Por isso, tive a ideia de colocar os depoimentos das pessoas reais no final”, afirma. “Tentei trazer a experiência de documentário e o prazer de trabalhar com ator nessa linguagem mais naturalista para Segunda Chamada, porque acho que a série precisa disso.”

A trama, das autoras Carla Faour e Julia Spadaccini, gira em torno do núcleo formado por cinco mestres, o diretor Jaci (Paulo Gorgulho), e os professores Lúcia (Debora Bloch), Sônia (Hermila Guedes), Eliete (Thalita Carauta) e Marco André (Silvio Guindane) – e a relação deles com seus alunos -, na fictícia Escola Estadual Carolina Maria de Jesus. As aulas ocorrem à noite, para jovens e adultos que tentam uma nova chance para terminar os estudos. A série mostra os desafios enfrentados dentro e fora das salas, mas também histórias de superação.

Em tempos em que a educação está no cerne de vários debates, a diretora diz que é “uma grande oportunidade” exibir a produção na TV aberta. “Poder passá-la para todo mundo que quiser assistir, isso é muito potente. Como Sob Pressão, é uma série que tem comprometimento social, no sentido que fala de algo que é uma mazela do Brasil. A saúde, a educação, a segurança com Carcereiros, por exemplo, é importante a gente colocar os assuntos na roda. É uma ficção, claro, mas estamos falando de alguma coisa que existe, que é real.”

A segunda temporada da série já está em fase de pré-produção e as filmagens começam no dia 19 de janeiro. Os cinco professores continuam na trama, mas o elenco de alunos praticamente será todo renovado. O principal tema da nova temporada, ressalta Joana, é a evasão escolar, que atinge fortemente os cursos da Eja (Educação para Jovens e Adultos). E, entre os novos alunos, surgirá o personagem do ator Ângelo Antônio, que interpreta um homem que perde mulher e filha num deslizamento, vira morador de rua, começa a beber, mas decide voltar a estudar.
“Para a gente que está do lado de cá, fazendo, é muito bom ver que a série é bem-recebida, porque é uma sensação que ainda existe um bom Brasil dentro do Brasil”, diz Joana.

Diálogo

Derivada do filme homônimo de 2016, a série Sob Pressão, dirigida por Andrucha Waddington, tem como figuras centrais os médicos Carolina e Evandro, vividos magistralmente por Marjorie Estiano e Julio Andrade – pelo papel, Marjorie foi indicada para o Emmy. Mais do que revelar as dificuldades do dia a dia enfrentadas em um hospital público, a produção se aprofunda nos dramas pessoais dos protagonistas e também dos pacientes – tal e qual acontece com Segunda Chamada.

“Acho que Sob Pressão reúne três elementos que a destacam como série: o conceito – um hospital público numa zona de conflito; a oportunidade de se aproximar da realidade a partir da linguagem e da conversa sobre temas e suas abordagens sem julgamento; e a realização – a direção e o texto se complementam, além do elenco ser um dream team, tanto de personagens fixos quanto de participações”, analisa o autor da série, Lucas Paraizo. Para ele, o público não quer apenas o escapismo quando assiste a uma obra ficcional. “Ele quer diversidade de emoções. Acho que a televisão aberta deve ser variada, como tenta ser já que não trabalhamos com nichos de público”, afirma Paraizo. “Sob Pressão e Segunda Chamada têm público semelhante e dialogamos entre nós. Assim como o Carcereiros discutiu a questão da segurança no Brasil, o Sob Pressão fez com a saúde e agora o Segunda Chamada faz com a educação. São pilares editoriais da dramaturgia seriada da TV Globo na troca com a sociedade.”

Apesar de ser uma novela, Amor de Mãe, da Globo, também tem seguido uma linha mais realista. Autora da trama, Manuela Dias afirma não ver contradição entre folhetim e realismo. “Pelo contrário, a vida nos fornece uma experiência muito ligada à estrutura do folhetim. Esse drama, às vezes cômico, às vezes trágico, que nos acompanha desde que nascemos até a morte. Tento usar essa ligação, desse absurdo cotidiano que é a nossa experiência diária”, diz Manuela, que assina sua primeira novela depois do sucesso de séries suas na emissora, como Justiça. “Como criadora audiovisual, tento estar conectada com o mundo e com as pessoas ao meu redor. Não sinto que todos queiram o escapismo, a princípio. A dramaturgia tem uma função ancestral civilizatória de nos ajudar a traçar parâmetros morais, éticos e comportamentais. Por isso, acho que, quando temos dilemas nas tramas que servem de exemplo para nossas experiências, sinto que estamos cumprindo essa função humana e social da contação de história.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Google News

Whatsapp CGN 3015-0366 - Canal direto com nossa redação

Envie sua solicitação que uma equipe nossa irá atender você.


Participe do nosso grupo no Whatsapp

ou

Participe do nosso canal no Telegram

Veja Mais
Sair da versão mobile