‘Alegria, Alegria’ na despedida da maestrina Marin Alsop

Foi esse o sentimento da plateia que lotou a Sala São Paulo na quinta, 12, para assistir a uma performance que os economistas chamariam de heterodoxa:...

Publicado em

Por Agência Estado

Num dos vários livros que dedicou a Beethoven, o pesquisador americano Scott Burnham escreveu uma frase que define nossa relação com sua música nos 250 anos de seu nascimento e quase 200 de sua morte: “Ele continua a nos estimular e provocar, e não podemos deixá-lo ir embora porque sua música permanece uma provocação sonora que nos coloca diante do que adoramos pensar que é o melhor de nós mesmos”.

Foi esse o sentimento da plateia que lotou a Sala São Paulo na quinta, 12, para assistir a uma performance que os economistas chamariam de heterodoxa: o quarto movimento, Ode à Alegria, cantado em português. O Carnegie Hall de Nova York recrutou a regente Marin Alsop para comandar oito execuções da Nona em vários continentes ao longo de 2020, com a Ode à Alegria cantada na língua local.

E nós fomos escolhidos para abrir o projeto nos concertos finais de Alsop depois de oito anos à frente da Osesp. Se o balanço do período não chega a ser positivo, em camadas mais profundas as esperanças de tempos melhores já se deslocam para o novo titular, Thierry Fischer.

A proposta funcionou. Desde a tradução para o português do diretor artístico da Osesp até sua sacada de justapor o verso Alegria, Alegria à canção de Caetano Veloso dos anos 1960. Lembrei-me de outra canção dele, Podres Poderes, que começa contundente, mas termina com acentos beethovenianos: “Eu quero aproximar o meu cantar vagabundo/Daqueles que velam pela alegria do mundo”.

Três transições de obras brasileiras contemporâneas foram salpicadas entre os movimentos: duas de Clarice Assad, a segunda vestindo a canção de Caetano com uma épica casaca sinfônica, precedendo os versos de Schiller. E a excelente Cabinda: nós somos pretos, do baiano Paulo Costa Lima. Inesperadas, porém inclusivas e bem-sucedidas, conexões São Salvador-Viena.

Firme, empenhada, Alsop conseguiu na despedida o que nem sempre obteve dos músicos da Osesp nesses oito anos: adesão plena a sua regência. Os corais, dois da Osesp e o da Orquestra Jovem do Estado, saíram-se bem. Já os quatro solistas foram colocados atrás à esquerda no palco, o que gerou problemas de audição (ao menos para quem, como eu, estava na penúltima fila de cadeiras da Sala). Só quando veio até o primeiro plano, a voz poderosa de Paulo Szot foi ouvida em sua plenitude.

Em todo caso, raras vezes a plateia irmanou-se tanto com o que acontecia no palco, todos unidos pela mensagem libertária em viés caetanizado: caminhando “contra o vento com a alegria de um herói”, Beethoven é atemporal porque, como escreve Burnham, adoramos pensar que ele faz aflorar em nós o melhor de nós mesmos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Google News

Whatsapp CGN 3015-0366 - Canal direto com nossa redação

Envie sua solicitação que uma equipe nossa irá atender você.


Participe do nosso grupo no Whatsapp

ou

Participe do nosso canal no Telegram

Veja Mais
Sair da versão mobile