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Turismo e crise climática: os caminhos sustentáveis para a Amazônia

Toda a região sente os efeitos sociais e econômicos da estiagem. Um dos setores mais afetados é o turismo, fonte de renda para boa parte da......

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Por CGN

É início de dezembro em Manaus, e o calor é escaldante. O Amazonas enfrenta a pior seca da história, com níveis de água baixíssimos, como nunca se viu antes. No percurso de lancha até o encontro dos rios Negro e Solimões, o guia indica no horizonte partes de terra do continente e das ilhas que já deveriam estar cobertas por água.

Toda a região sente os efeitos sociais e econômicos da estiagem. Um dos setores mais afetados é o turismo, fonte de renda para boa parte da população. O calor e a seca afastam os visitantes, porque muitas atividades estão prejudicadas.

 

“Aqui, quando tem temporal e ventania, é muito perigoso. É muito violento o vento aqui, então a gente corre muito risco. Mas a gente precisa da renda e não pode parar”, diz Daniel Hanrori.

Ele conversa com a reportagem da Agência Brasil sentado em uma pedra, mais ofegante e com muitas gotas de suor escorrendo pelo rosto. Foram 20 minutos de apresentação para um grupo de 15 turistas, com explicações sobre a cultura e danças tradicionais. Além do calor, o cansaço é agravado pela preocupação para manter a aldeia em condições básicas de moradia e alimentação.

Daniel Hanrori diz que os indígenas dependem do turismo e da venda de artesanato para sustentar as famílias – Tânia Rêgo/Agência Brasil

“O número de visitantes está muito baixo, infelizmente. Quando o rio está cheio, a gente recebe aqui de 50 a 60 lanchas por dia. De 8h da manhã até 6h da tarde. Durante esse período da seca, a gente recebe só duas lanchas. E a gente depende muito do turismo e das vendas de artesanato”, complementa Daniel Hanrori. “Afeta também muito a pesca, que fica mais difícil, mais escassa. Em alguns lugares, morreu muito peixe. E tudo isso faz falta. A gente aqui vive 50% do turismo e 50% da pesca.”

Em setembro, a Praia de Ponta Negra, principal balneário de Manaus, foi interditada para banhistas, depois que o Rio Negro ficou baixo da cota mínima de segurança de 16 metros. O Museu do Seringal, que fica no Igarapé São João, foi fechado temporariamente, porque o acesso é exclusivamente pelo rio.

Em Alter do Chão, no Pará, cuja alta temporada costuma começar em agosto, o nível baixo do Rio Tapajós prejudicou o deslocamento das embarcações que transportam turistas para ilhas, restaurantes e estabelecimentos comerciais. O Sairé, um festival cultural realizado em setembro, teve de ser suspenso por falta de demanda.

A professora Isabel Grimm, doutora em meio ambiente e desenvolvimento pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), destaca que, quando se fala de crise climática e turismo, no entanto, há de se pensar também sobre a responsabilidade que o próprio setor possui nos impactos ao meio ambiente.

Turismo de base comunitária

A 600 quilômetros (km) a oeste de Manaus, na região do curso médio do Rio Solimões, um programa de turismo de base comunitária tem contribuído para o desenvolvimento local desde 1998. Ele é promovido pelo Instituto Mamirauá, que leva o nome da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, e tem sede na cidade de Tefé. O principal resultado desse trabalho é a Pousada Uacari, que recebe visitantes para uma experiência imersiva na Amazônia.

Entre as metas principais do programa estão contribuir para a conservação dos recursos naturais, promover empoderamento local e o desenvolvimento econômico e social das comunidades envolvidas. Mestre em gestão de áreas protegidas na Amazônia, Pedro Nassar coordena o programa no Instituto Mamirauá e contabiliza pelo menos 11 comunidades beneficiadas diretamente ao longo destes 27 anos.

“O turismo comunitário precisa ser diferente do turismo de massa. Não visa à exploração de atrações com grande quantidade de pessoas, em que elas chegam e saem do lugar como se nada tivesse acontecido. No turismo de base comunitária, os locais têm uma participação efetiva na gestão no planejamento e nas discussões. Não são trabalhadores que vão lá, cumprem a função, ganham dinheiro e vão embora para casa. Os benefícios do turismo precisam ser compartilhados com a comunidade, e precisam ser econômicos, sociais, culturais e ambientais”, explica Pedro Nassar.

Pousada Uacari proporciona aos visitantes uma experiência imersiva na Amazônia – Gui Gomes/Divulgação

Os moradores envolvidos no programa são afiliados a uma associação local e trabalham em sistema de rodízio, aproximadamente 12 dias por mês. Cada hóspede da Pousada Uacari contribui com a Taxa de Apoio Socioambiental, destinada ao financiamento de projetos e recursos comunitários, como compra de barcos, construção de centros comunitários e rádio de comunicação.

Outra preocupação do instituto é formar multiplicadores, que possam participar de atividades a fim de disseminar conhecimentos para o desenvolvimento do turismo comunitário em outras regiões do país.

Experiências comunitárias

Uma das pessoas impactadas pelo projeto foi Ilana Ribeiro Cardoso, artesã e empreendedora que vive no quilombo de Mumbuca, no município de Mateiros, região do Jalapão, no Tocantins. Em 2018, ela esteve no Instituto Mamirauá e conheceu de perto as iniciativas de turismo comunitário. A partir dali, a Amazônia virou uma fonte de inspiração e aprendizado.

Desde então, faz intercâmbios em regiões que trabalham com turismo comunitário e aplicando os novos conhecimentos no Jalapão. Ela ajuda a organizar restaurantes, pousadas e roteiros para que turistas conheçam de forma mais autêntica a comunidade e a história do quilombo. Entra as experiências, trilhas feitas por antepassados, mostra de plantas medicinais e oficinas de artesanato com capim-dourado.

Enquanto vê as atividades crescerem, Ilana se preocupa com os possíveis impactos de um turismo que não seja sustentável para a região.

“Hoje, não vemos muitos impactos ambientais. Mas, e no futuro? Como ficam meu filho e a comunidade? No Jalapão, tem muitas nascentes, fervedouros, cachoeiras, rios. Somos ricos em água potável. E há pessoas vindo para cá e pensando só na questão do agronegócio, em plantar soja, usar e poluir as nascentes de água”, diz Ilana.

“Daqui a pouco, podem montar um hotel de luxo, e a nossa pousadinha, que é simples, baseada na bioconstrução com adobe, vai ser prejudicada. Eu tenho medo de que o Jalapão possa ser invadido por esse turismo avassalador, que desperte o interesse de pessoas ricas, que não vão cuidar do nosso local e vão destruir a nossa natureza”, completa a artesã e empreendedora.

Ilana defende o turismo comunitário como o único possível para impedir grandes impactos ambientais e aumentar os efeitos da crise climática.

A artesã e empreendedora Ilana Cardoso na colheita de capim-dourado no Jalapão – Ilana Cardoso/Arquivo Pessoal

“Quando o turismo é sustentável, envolve cuidado. E quem cuida é a comunidade. Então, o turismo precisa vir de baixo, não de cima. Nós sabemos como cuidar, sabemos a quantidade de pessoas que podem entrar nos fervedouros, no campo de capim, numa vereda, numa nascente. A gente não pensa só na questão do lucro. No turismo sustentável, o guia é local, deixa dinheiro na comunidade e contribui para a preservação da natureza”, diz a empreendedora quilombola.

Série sobre a Amazônia

A reportagem faz parte da série Em Defesa da Amazônia, que abre o ano da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), a ser realizada em Belém, no mês de novembro. Nas matérias publicadas na Agência Brasil, povos da Amazônia e aqueles diretamente engajados na defesa da floresta discutem os impactos das mudanças climáticas e respostas para lidar com elas.

* A equipe viajou a convite da CCR, patrocinadora do TEDxAmazônia 2024.

Fonte: Agência Brasil

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