Exposição retrata jornada de Ailton Krenak por comunidades na Amazônia
Nos percursos, que duraram dezenas de horas, ocorreram encontros em canoas, praias de rios e em aldeias com as etnias Ashaninka, Xavante, Krikati, Gavião, Yawanawá, Huni......
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Por CGN
A exposição Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak, aberta à visitação nesta quarta-feira (25), no Instituto Tomie Ohtake, apresenta fotografias de viagens às aldeias e comunidades na Amazônia brasileira, registradas entre 1993 e 1997. Os trabalhos do fotógrafo Nagakura foram realizados em incursões acompanhando o líder indígena Ailton Krenak.
Nos percursos, que duraram dezenas de horas, ocorreram encontros em canoas, praias de rios e em aldeias com as etnias Ashaninka, Xavante, Krikati, Gavião, Yawanawá, Huni Kuin, além do povo Guarani de São Paulo e em comunidades ribeirinhas no Rio Juruá e região do lavrado em Roraima. As viagens, que tinham a companhia também da produtora e intérprete Eliza Otsuka, alcançaram os estados do Acre, Roraima, Mato Grosso, Maranhão, São Paulo e Amazonas.
“Essa é uma celebração em torno de uma amizade de mais de 30 anos com o fotógrafo japonês Hiromi Nagakura. Ele vinha ao Brasil uma ou duas vezes por ano e a gente viajava visitando áreas de projeto que eu estava desenvolvendo na Amazônia em territórios indígenas. Eu estava fazendo pesquisas florestais. E o Nagakura decidiu que ia me acompanhar nessas viagens todas e produzir publicações no Japão”, contou Ailton Krenak, que fez a curadoria da exposição.
Ailton Krenak, curador da exposição em SP- Rovena Rosa/Agência Brasil
A aproximação entre Krenak e Nagakura começou em conversa, sentados em esteiras, na sede da Aliança dos Povos da Floresta, na capital paulista, onde se conheceram, quando Eliza apresentou o plano de viagens do fotógrafo.
“Quando Nagakura publicou no Japão, fez uma exposição grande em Tóquio e publicou o primeiro livro, ele intitulou essas viagens de viagens filosóficas. E foi também a primeira pessoa que me atribuiu o título de filósofo da floresta, há 30 anos atrás, lá no Japão”, lembrou Krenak. Essa é a primeira exposição da obra de Nagakura no Brasil.
O fotógrafo Nagakura, em entrevista à Agência Brasil por meio da intérprete Eliza, contou que a importância do encontro com o Ailton e das nossas viagens é o pensamento e o respeito do líder indígena pela vida. “Quando ele entra na floresta, vê os rios, as árvores, a montanha, ele sempre tem muito respeito e pede licença para poder adentrar esses lugares. Isso não ocorre com os europeus, por exemplo. E nesse nosso trajeto, eu aprendi a ver a importância que os indígenas dão a toda forma de vida. E o privilégio foi ter o Ailton como guia” revelou o fotógrafo.
Para o líder indígena Krenak, a exposição representa uma extensão dos afetos, dessa amizade entre os dois e do contentamento que foi conhecer tantas pessoas naquelas viagens. “Foram pessoas, comunidades, que constituíram rede de afetos que está sendo celebrada nessa curadoria que tive a oportunidade de fazer com uma proximidade muito grande com Hiromi Nagakura, que é o autor das imagens, e com Elisa Utsuki, que é a minha intérprete nessa convivência com o Nagakura já há décadas”, disse Krenak.
A mostra traz ainda algumas imagens de Nagakura feitas em territórios em conflito, como África do Sul, Palestina, El Salvador e Afeganistão, antes das viagens pela Amazônia. “Ele é um fotógrafo que acompanhou guerras no mundo e que decidiu me acompanhar na floresta. Foi uma transição do caminho que ele fazia, estava exausto de ver guerra, e resolveu ver a floresta junto comigo, e pra mim foi um presente maravilhoso”, explicou.
Krenak afirma que a exposição é uma celebração e um alívio imediato após o governo de Jair Bolsonaro, que deixou prejuízos profundos aos povos indígenas. “Infelizmente a gente teve que suportar aquele período de flagelo e agora nós estamos aqui celebrando a vida”, disse.
“Para as comunidades indígenas, é uma oportunidade muito grande de reencontro com Hiromi Nagakura e com suas próprias imagens, que estão aqui refletindo um tempo de lutas e também um tempo de muita festa, muita celebração e de alegria que esses povos expressam no seu cotidiano nas aldeias”, finalizou.
As fotos da exposição foram feitas há cerca de 20 anos. Para o fotógrafo, as imagens mostram como essas pessoas continuam vivas, que a mostra é atemporal. “Você vê os Krikatis, Yanomami, Yawanawá, Kaxinawá, eles continuam vivos, eles estão aumentando. Veio uma Ashaninka [na exposição], trouxe uma filha de 15 anos. Então a gente vê que é assim, não é uma coisa da história, eles acabaram. É uma exposição de pessoas vivas. Não acabou, não é história. A gente vê a esperança do futuro”, revelou.
“Eu fico feliz de ser um sujeito, de ter visto essa evolução. Tem uma krikati que veio pra cá nos visitar e ela falou que o pai dela morreu, eu a conheci criancinha e agora ela vem aqui e me fala que teve o neném, que cresceu e que agora tem um outro neném também. Então é a continuidade que é bonita. E as pessoas que estão aqui são a prova viva disso. É assim, apesar dos 20 anos, eu não vejo nostalgia, eu só vejo vida e futuro”, disse Nagakura.
O fotógrafo contou sobre uma das passagens que teve com o líder indígena, mostrando que tradição e lugar de vida são importantes. “Eu tenho certeza que se essas pessoas quiserem viver na cidade, elas vão conseguir. Se tiver dinheiro, compra tudo. Mas o que eu aprendi com a Ailton é que não compra vida. Uma certa vez ele me falou: tem um povo que vendia uma cesta por 50 reais para comprar alguma coisa, mas aí veio um europeu, achou a cesta linda, falou não, eu quero que vocês façam mil. E essas pessoas se recusaram, disseram que, para fazer mil, eles vão ter que parar de viver. E aí eu observo que foi o que os japoneses fizeram. Os japoneses viveram de trabalhar e esqueceram de viver”, contou Nagakura.
A exposição Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak fica aberta ao público até 4 de fevereiro de 2024, de terça a domingo, das 11h às 19h, com entrada gratuita, no Instituto Tomie Ohtake, localizado na Avenida Faria Lima, 201. Haverá ainda o lançamento do livro Um rio, um pássaro, de Ailton Krenak, na sexta-feira (27).
Fonte: Agência Brasil
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